18 dezembro 2010

Trânsito em Belo Horizonte: "Só o BRT não resolve"

Especialista reconhece méritos do ônibus rápido, mas o descarta como solução para a capital mineira

"Se o metrô existir, a demanda aparece", diz Gouvêa (crédito: Arquivo)
 
No fundo, todo belorizontino sabe: a solução para o trânsito na cidade é o metrô. A obra é de responsabilidade federal, mas já tem status de novela mexicana na capital mineira. O metrô está no PAC 2, com previsão de construção dos ramais Barreiro/Área Hospitalar e Pampulha/Savassi (linhas 2 e 3, respectivamente).

O porém é que a obra, além de demorada, não sai tão cedo: as informações da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) são de que o projeto executivo da linha 2 ainda não foi concluído e o da 3 sequer tem data para começar. “Dizem que o metrô é caro, mas não fazem a conta de quanto a sociedade pagará, no futuro, com as horas perdidas nos congestionamentos”, alerta o professor da UFMG e engenheiro especialista em trânsito, Ronaldo Guimarães Gouvêa.

“O BRT é uma unidade de transporte de maior capacidade que o veículo convencional, devido às pistas exclusivas, mas ele é de capacidade média. Ele está sendo colocado como forma de lavar um pouco as mãos, mas não resolve o problema”, afirma.

A prefeitura trabalha com projeções de atender 40 mil pessoas/hora com o BRT, e de que isso seja suficiente, uma vez que ainda não há demanda para mais de 70 mil pessoas/hora, o que só poderia ser atendido com o metrô. “Eles estão trabalhando com a ideia incorreta de que é preciso demanda para ter metrô.
 
Ela não existe porque está pulverizada em muitas linhas de ônibus.
 
O metrô precisa operar de forma integrada com outros meios de transporte, é preciso ter uma alta capilaridade, chegar com o ônibus na moradia da pessoa. Se o metrô existir, a demanda aparece”, defende o engenheiro.

Gouvêa explica que a região metropolitana, com mais de cinco milhões de habitantes, apresenta queda no número de usuários do transporte público coletivo devido à sua baixa qualidade. Os mineiros estão comprando carros e motos, o que ajuda a colapsar o trânsito e aumentar o número de acidentes. “É preciso valer a pena para o motorista deixar o veículo em casa”, afirma.

Escolhas inadequadas

Gouvêa fala com a autoridade de um mestrado e um doutorado sobre regiões metropolitanas, além de já ter ocupado cargos de direção na extinta Metrobel e no Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais. Para ele, muito do que se vê de problema no trânsito de Belo Horizonte e de outras capitais é fruto da falta de uma visão global e integrada. "Hoje o engenheiro é especializado apenas na questão do tráfego, e não entende de urbanismo. Isso é um problema terrível, porque a cidade não acontece na rua, ela  acontece no entorno da rua", afirma.
 
Esse é um comentário que atinge diretamente a política de grandes corredores de veículos. BH é uma cidade que, pelo seu planejamento, naturalmente possui um desenho radial, com todas as avenidas importantes convergindo em direção ao centro. O ideal seria dar aos veículos rotas alternativas em vez de facilitar que cheguem todos juntos, cada vez mais rápido, a um mesmo ponto de gargalo.

"Esse modelo de urbanização voltada para o automóvel não funciona bem. Veja a (avenida) Cristiano Machado, que recebeu a Linha Verde como proposta de tornar Confins num aeroporto estratégico. Transformá-la em via expressa não beneficia nem um pouco as pessoas em seu entorno. Quem mora no bairro Cidade Nova não se beneficiou.

Ela ganhou engarrafamento na porta de casa, e não consegue utilizar aparelhos urbanos como um colégio que está do outro lado da avenida, porque é quase impossível o pedestre atravessar todas as pistas", argumenta.

O especialista aponta duas grandes ações além do metrô como fundamentais para resolver o trânsito na capital mineira. A alça leste do atual anel rodoviário e a construção de um grande rodoanel. “Todos os veículo que vem da BR-040 com destino a Sabará ou bairros da zona leste são obrigados a passar pela Savassi. Isso é uma punição tanto para a Savassi, que por si só já possui uma grande demanda, como para o motorista que não tem o interesse de passar por lá. Vale para os carros e para caminhões, o que inclusive foi motivo de acidentes trágicos nos últimos anos", lembra Gouvêa.

Outra necessidade apontada por Ronaldo é a de um verdadeiro anel rodoviário, uma vez que ele considera o atual aquém desse título. "O anel hoje é uma avenida que atende porcamente seu papel de ligar bairros extremos e cidades próximas, só que com um tráfego de rodovia que ela é incapaz de suportar. Em vez de duplicar avenidas e as tornar vias expressas, deveria ser investido em um grande anel rodoviário, com um tráfego externo ao município de Belo Horizonte, que o contornasse de fato, ligando as rodovias de acesso.

O anel de hoje faz apenas um arco dentro da cidade, sem funcionar para leste da capital. Um grande anel rodoviário, contornando Belo Horizonte, interligando os acessos e sem conflito com a área urbana é uma obra muito mais estratégica e que não é discutida", diz.

Arquivo INFOTRANSP