13 novembro 2010

Bilhete Único Carioca não é aceito em ônibus refrigerados e empresas serão notificadas

Publicada em 12/11/2010

RIO - Numa cidade onde as temperaturas passam dos 40 graus, nos últimos dois dias equipes do GLOBO testaram quatro linhas de ônibus que têm apenas carros com ar condicionado.

E constataram que, nelas, apesar da viagem mais confortável, os passageiros não podem usufruir do Bilhete Único Carioca (BUC) - que completa neste sábado uma semana. As empresas alegam que o ar refrigerado torna a passagem mais cara, por aumentar o consumo dos motores. Como o decreto que criou o BUC determina que 80% da frota de cada linha aceitem o bilhete, elas serão notificadas pela Secretaria municipal de Transportes (SMTR).
Segundo a SMTR, linhas que só tenham carros com ar condicionado não estão livres de obedecer a este percentual. Ou a empresa aceita o bilhete nos veículos com ar ou coloca veículos sem ar nas ruas. Espalhados por toda a cidade, há 918 ônibus com ar no Rio - 10,5% da frota de 8.745 coletivos do município.
Sexta-feira de manhã, repórteres do GLOBO embarcaram na linha 126 (Rodoviária-Copacabana), da Viação Real, que tem apenas carros com ar, com um Bilhete Único intermunicipal - habilitado para o BUC. Cerca de 20 minutos antes, o bilhete já tinha sido usado em outro ônibus, da linha 128 (Leblon-Rodoviária), quando tinham sido descontados R$ 2,40 do cartão. Mas, na roleta do 126, mais R$ 2,70 foram, indevidamente, debitados.
Cartões são debitados 2 vezes
Situação parecida ocorreu com a doméstica Fabiana Santos Pereira, de 29 anos, moradora de Campo Grande. Ela chegou à Rodoviária Novo Rio para pegar o 126 depois de, uma hora e meia antes, embarcar num S-14 (Campo Grande-Tiradentes). Pela primeira viagem, teve descontados R$ 2,40 de seu cartão. Na segunda, outros R$ 2,70.
- Estava esperançosa de poder usar o bilhete único. Mas, infelizmente, não foi o que aconteceu. Pior que, na 126, só tem ônibus com ar condicionado. Terei que pedir a meu patrão o valor integral das duas passagens (R$ 10,20 por dia, ida e volta). Caso contrário, se eu receber R$ 4,80 de passagem por dia (valor que precisaria usando o BUC), vou ter prejuízo. Para mim, o bilhete ainda não serviu - lamenta ela, que reclama ainda do tempo máximo de validade do bilhete, de duas horas entre as duas roletas.
Outra passageira do 126, a manicure Rosana da Silva Rosa, de 47 anos, não consegue usar o BUC em nenhum dos três ônibus que pega de sua casa, em Sepetiba, até o trabalho, num salão de beleza em Botafogo. Na primeira linha, a S-3, de Sepetiba a Santa Cruz, paga R$ 2,40. Em Santa Cruz, ela diz que não tem opção de ônibus sem ar condicionado e acaba pagando R$ 4,70 até a Rodoviária, onde gasta mais R$ 2,70 no 126.
- Pago do meu bolso cerca de R$ 400 por mês em passagens. Se o bilhete valesse em pelo menos uma dessas baldeações, já seria uma boa economia no orçamento. Pior é que gasto tanto para ficar até cinco horas por dia dentro de ônibus. É muito cansativo - afirma.
Na linha 2111 (Praça Seca-Castelo), da Viação Redentor, mais uma vez há apenas carros com ar condicionado e, como comprovou a equipe do GLOBO, não aceitam o BUC. No início da tarde, ao embarcarem com o bilhete num ônibus da linha, na Praça Seca, os repórteres tiveram R$ 2,90 descontados. E quando subiram em outro carro, meia hora depois, da linha 763 (Madureira-Santa Maria), em Campinho, na Zona Norte, mais R$ 2,40 foram debitados do cartão.
- Outras linhas fazem o trajeto para o Centro, mas sempre com carros lotados e desconfortáveis. Nesta linha só tem carros com ar, e não aceitam o bilhete. Isso só pode estar errado - reclama o promotor de vendas Jorge Ferreira dos Santos, de 35 anos, passageiro do 2111.
Dificuldade parecida enfrentam os usuários de outra linha da Redentor, a 2113 (Taquara-Castelo), a única opção do bairro até a Zona Sul sem baldeações. Nela, a passagem custa R$ 4,70, mas com a frota inteira equipada com ar condicionado, os motoristas dizem que a tarifa não diminui com o BUC. Relações-públicas da empresa, Júlio Cesar Miguel admite que a Redentor está se adaptando às novas normas e recebendo orientações da prefeitura. Mas, por enquanto, os carros com ar não serão integrados ao BUC. A mesma conduta deve ser seguida pela linha S-15 (Cesarão-Largo da Carioca), da Viação Algarve, outra com todos os carros refrigerados e sem BUC, com tarifas a R$ 4,70.
- A linha 388 (Santa Cruz-Tiradentes) cobre basicamente o mesmo itinerário da S-15, com tarifa modal de R$ 2,40, só que é paradora - alega o gerente da empresa, José Inocêncio de Oliveira, para explicar por que a S-15 não aceita o BUC.
A despeito das justificativas das empresas, o secretário municipal de Transportes, Alexandre Sansão, avisa que elas serão notificadas e, em caso de reincidência, poderão perder a concessão das linhas:
" - Elas terão que mudar porque estão operando de forma inadequada. Os consórcios estão sendo notificados sobre isso. O número máximo de ônibus diferenciados em cada linha é de 20%. Podem até colocar ônibus com ar a mais, desde que cobrem o valor do BUC, que é R$ 2,40. "
Subsídio explica desconforto
Sansão explica que o edital do BUC não contempla especificações sobre carros com ar porque, diferentemente do que o ocorre com o bilhete intermunicipal, as empresas no município não são subsidiadas, ou seja, não recebem o complemento do valor das passagens. Ele descarta que, no futuro, as empresas recebam subsídios. Mas admite a possibilidade de incluir na regra do BUC os ônibus com ar:
- É possível, assim como vamos ampliar o bilhete único aos trens, metrô e barcas. Primeiro, a gente alcança a maior parte da população que utiliza os 90% dos ônibus que não têm ar. Não existe mágica. Tem que ser feito de forma responsável. Temos que respeitar o contratos e a sustentabilidade do sistema, mas o subsídio está descartado.
No caso dos 7.500 coletivos das 103 empresas de ônibus intermunicipais, o bilhete único é aceito em ônibus com ar, desde que sejam com duas portas (frescões ou ônibus rodoviários não entram).
Outra queixa dos usuários sobre o BUC é o prazo de duas horas entre as roletas. Em bairros distantes como Santa Cruz, os engarrafamentos diários inviabilizam o benefício.

Arquivo INFOTRANSP