Elio Gaspari, O Globo
A joia da coroa da viagem de Dilma Rousseff à China foi o anúncio, saído do governo, de que o bilionário Terry Gou, controlador da Foxconn, apresentou um projeto de investimento de US$ 12 bilhões, capaz de gerar cem mil empregos (20 mil para engenheiros) em até seis anos.
A Foxconn é a maior exportadora da China, emprega 800 mil pessoas, tem fábricas de componentes eletrônicos em dez países e monta os iPhones, iPods e iPads da Apple.
Notícia melhor, não poderia haver, pelo tamanho do investimento, pelos empregos a serem criados, e também pela perspectiva de montagem dos iPads no Brasil. Infelizmente, os números divulgados fazem tanto sentido como a revelação de que alguém projeta produzir bifes de 750 quilos que custarão 42 centavos.
Entre outras limitações existentes para os dois lados, o Brasil não tem mão de obra disponível para uma empreitada desse tamanho. Todo o setor eletroeletrônico brasileiro emprega 175 mil pessoas e o mercado padece de um déficit de 20 mil engenheiros a cada ano.
Numa nota oficial genérica, a Foxconn não fez referências a cifras ou ao tamanho do projeto. Ademais, Terry Gou mostrou há pouco tempo que tem dos trabalhadores brasileiros a mesma opinião racista que os americanos tinham dos chineses no século XIX: “Assim que os brasileiros ouvem ‘futebol’, param de trabalhar. E há toda aquela dança. É louco...”.
Vale lembrar que o governo começou a flertar com o trem-bala dizendo que ele ligaria o Rio a São Paulo, custaria cerca de R$ 18 bilhões, financiado pela iniciativa privada. Na semana passada, foi criada uma estatal para cuidar de um projeto Rio-Campinas, cujo custo está estimado (por baixo) em R$ 33 bilhões, com R$ 20 bilhões financiados pela Viúva.
Descascando-se o negócio da Foxconn com o Brasil, chega-se ao caroço da montagem de iPads no país.
Hoje, uma tabuleta da Apple custa R$ 800 nos Estados Unidos e R$ 1.400 em Pindorama. Cerca de metade da diferença vem da mordida dos impostos. Numa maluquice tributária, o iPad, bem como outras tabuletas, não usufruem as isenções dadas aos computadores baratos. Por quê?
Porque não têm teclado, dizem os impostecas. De fato, o teclado desses equipamentos é virtual. Transposta para o tempo das carruagens, trata-se de uma restrição que negaria aos automóveis um benefício concedido aos veículos porque não eram puxados por cavalos.
Navios carregados de contêineres com peças de iPads devem chegar ao Brasil em julho, quando se espera que as tabuletas já estejam livres da pelanca tributária. Nesse caso, poderão custar entre R$ 1 mil e R$ 1.150, que já é uma grande coisa, sobretudo porque barra o estímulo à produção de carroças nacionais.