Três coisas determinavam se uma pessoa era adulta na Alemanha de antigamente: a maioridade, a carteira de motorista e o carro próprio. O mecânico Heribert Schröder, nascido em 1950, tornou-se adulto sem atrasos. Já antes de seu aniversário de 21 anos, um Ford Taunus 12M estava estacionado diante de casa. “O carro mal andava”, explica Schröder, que na época pagou 150 marcos pelo veículo.
O mecânico já havia passado no exame da carteira de motorista. Ao recebê-la, pontualmente no dia em que completou 21 anos, entrou no carro e acelerou. Daí por diante, ele passaria também muito tempo embaixo do veículo: apertando parafusos, consertando e mexendo no cano de escape, para que o som do motor parecesse ser o de um carro mais veloz. Naquela época, afinal, o significado de um automóvel não se media apenas pela sua utilidade.
Bildunterschrift: Sinal de liberdade: garota descansa sobre Fusca em Woodstock, 1969
O fator “cool”
Um carro era símbolo de status, diz Stefan Bratzel, diretor do Center of Automotive da Escola Superior de Economia em Bergisch Gladbach – um símbolo de status de grande força simbólica, talvez até mesmo a personificação de um estilo de vida.
Schröder recorda que ser dono de um carro dava a ele um sentimento de liberdade. Quem possuísse um automóvel podia “dar uma volta”, como ele diz, podia testar “que garotas atraia”, podia simplesmente desfilar diante dos outros. “Naquela época era assim”, explica Schröder, um pouco envergonhado, com a esperança de que não o entenda mal.
Relação sóbria
Assim era e sempre será: esse parecia ser o lema da indústria automobilística alemã desde então. Para as montadoras, era como se o desejo dos alemães pelo automóvel fosse uma espécie de programa biológico, que rodava automaticamente quando chegava a hora – assim como um grunhido na barriga avisa que é hora de comer.
Mas já há alguns anos os fabricantes de carros vêm percebendo que a relação entre os alemães e o automóvel está mudando radicalmente. No final dos anos 1990, a Mercedes lançou o Classe A, direcionado principalmente para o público jovem, como modelo de entrada – mais tarde, essa clientela deveria enfiar a mão ainda mais fundo no bolso e comprar um automóvel da classe superior. No entanto, o Classe A é até hoje popular sobretudo entre os mais velhos. A clientela jovem manteve-se afastada.
Bildunterschrift: Großansicht des Bildes mit der Bildunterschrift: Especialista Stefan Bratzel pede mais design e eletromobilidadeO automóvel não desempenha mais nenhum papel no imaginário cotidiano de 30% a 40% dos jovens adultos nas cidades, afirma Bratzel. Sobretudo, ele não é mais um produto com o qual os jovens associam estilo de vida, emoções e sentimentos, diz. Se, em 1988, 16,4% das compras de carros novos na Alemanha eram efetuadas por pessoas entre 18 e 29 anos, 20 anos depois essa proporção caiu para 7,6%. E alguns dão até mesmo um passo além: dispensam a carteira de motorista. Em 1998, 89,4% dos jovens entre 18 e 25 anos possuíam a carteira. Dez anos mais tarde, eram 75,5%.
Aversão justificada
O papel do automóvel nos anos 1980 e começo dos anos 1990, explica Bratzel, é desempenhado hoje pelo iPhone, pelo iPod, pelo iPad. Interconexão social – essa é a megatendência dos tempos atuais. Estar no Facebook é o atributo diferencial, diz Bratzel. Saber em poucos segundos o que os amigos estão fazendo no outro lado do mundo. Conhecer novas pessoas sem sair do lugar. O automóvel, da forma como ele é hoje, não se encaixa nesse mundo.
Além disso, os ônibus, trens e bondes são muito melhores hoje do que eram antigamente, argumenta Bratzel. Hoje a mobilidade é possível sem o automóvel – ao menos nas grandes cidades. E existem motivos suficientes para deixar o carro em casa: faltam vagas para estacionar, autoestradas e vias principais estão constantemente engarrafadas, os automóveis prejudicam o meio ambiente. E o preço dos carros novos subiu vertiginosamente.
A indústria automotiva poderia simplesmente esperar até que o salário dos jovens seja alto o suficiente, trazendo consigo a vontade de comprar um carro. A questão é: que tipo de carro pode vir a adquirir alguém que não se interessa por carros, que associa sons de motores a barulho e potência a acidentes. Para Bratzel, é certo que se trata de uma questão de valores: somente quem acha o automóvel cool e emocionante está disposto a pagar muito por ele. Se o carro é apenas um meio de transporte, diz Bratzel, “então eu não vou comprar um top de linha”.
Um setor se reinventa
Bildunterschrift: Großansicht des Bildes mit der Bildunterschrift: Carro do futuro conseguirá interessar a jovens?O especialista em automóveis diz que a indústria automotiva tem de fazer alguma coisa, caso contrário paira o perigo de ela se tornar supérflua. Entre os fabricantes de carros premium, a Audi e a BMW ainda são os que mais atraem o público jovem – diferentemente da Mercedes.
Bratzel defende mais eletromobilidade, design mais empolgante, mais conexão com outros meios de transporte. E a indústria automotiva se esforça. Depois de muito tempo sem fazer nada, ela começou a se mexer há um ou dois anos, diz o especialista.
O projeto “Mu by Peugeot” é resultado de tal esforço. Desde maio do ano passado, a montadora francesa disponibiliza carros de aluguel em três bairros berlinenses. “Revolução vinda da França” é o nome dado pela companhia ao seu projeto, embora o car sharing em si não tenha nada de revolucionário. Mas a Peugeot não deixar de ter certa razão: que uma montadora não somente venda, mas também alugue carros a clientes particulares, é algo novo.
E o resultado final deve ser o que antes era óbvio. O cliente do car sharing se decide pela compra – depois de ter se apaixonado cada vez mais por seu Peugeot, após cada viagem. Da mesma forma, a montadora Daimler pretende em breve, em parceria com a locadora de automóveis Europcar, realizar seu projeto “car2go”.