O número de celulares só cresce, mas a insatisfação de clientes demonstra
como o setor sofre para resolver suas deficiências
A funcionária pública Amanda Lima queria um iPhone. Cliente da TIM, ela foi
atraída por uma promoção da Claro, que oferecia desconto no aparelho em troca de
um plano de R$ 90 mensais com internet ilimitada. Segundo o vendedor, a primeira
mensalidade seria de R$ 130 e o valor cairia nos meses seguintes. Isso não
aconteceu.
Amanda está há mais de três meses pagando mais do que combinou na
loja – e a velocidade de sua conexão fica lenta depois de atingir a cota de
dados.
“Terei de ir ao Procon. Pela Claro mesmo não consigo resolver”, diz ela, que
só não troca de operadora agora porque está presa à fidelidade de um ano.
A
portabilidade numérica, aprovada pela Agência Nacional de Telecomunicações
(Anatel) em 2007, deveria aumentar a concorrência entre operadoras. Na prática,
é mais um dos motivos que estão levando ao colapso do sistema de telefonia móvel
no País, que a revista Economist diz ser “o próximo apagão”.
“A portabilidade cria mais condições de fidelização do consumidor”, diz
Veridiana Alimonti, advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
(Idec). “O que vemos são ofertas mais agressivas, o que impacta na qualidade dos
serviços.”
Em julho, a Anatel proibiu Oi, TIM e Claro de venderem novas linhas de
celular. Segundo a consultoria IDC, a capacidade das redes não foi suficiente
para atender à demanda, aquecida por causa da guerra de preços entre operadoras.
Entre 2009 e 2011 o número de linhas subiu 40%, mas os investimentos em
infraestrutura foram insuficientes.
A venda de novas linhas foi liberada depois
de as operadoras apresentarem um plano de melhorias, mas os problemas
continuam.
Segundo Veridiana, entre as ofertas agressivas das operadoras, estão os
planos de fidelização – como o Infinity da TIM, alvo de denúncia grave do
Ministério Público do Paraná (MP-PR, leia abaixo entrevista com o promotor
responsável pela ação).
Segundo dados da Anatel analisados pelo MP-PR, a TIM é suspeita de
interromper de propósito as chamadas feitas por usuários do plano. No Infinity,
o usuário paga por chamada realizada, não pela duração. Quanto mais ligações,
mais lucro. O relatório aponta que, para clientes do Infinity, a queda ra quatro
vezes maior do que para clientes de outros planos. A TIM teria lucrado R$ 4,3
milhões com a medida.
“Meus amigos falam que eu desligo na cara deles”, diz a estudante Mariana
Barros, de Macapá (AP), cliente da TIM e do Infitiny há três anos. “Às vezes
fico que nem pateta falando e, quando vejo, a ligação é finalizada.” Marina foi
cliente da Vivo, mas trocou de operadora porque tinha de recarregar os créditos
a cada quatro ou cinco dias.
A TIM nega “veementemente” a acusação. “Uma derrubada deliberada de chamadas
é fraude, é crime, e precisa ter respaldo técnico e documental de altíssima
segurança”, disse Mario Girasole, presidente da TIM, em audiência no Senado. “A
denúncia não é uma posição oficial da Anatel e apontou falhas na metodologia
aplicada.”
O MP-PR também investigará outras operadoras de telefonia. Os promotores
querem apurar se as empresas cumprem, no Estado, o plano geral de metas e
qualidade definido pela Anatel.
Mas o que diz a Anatel? Segundo o plano geral da agência, as operadoras devem
completar apenas 67% das chamadas. Se 43% das ligações não forem completadas,
está tudo bem para a agência. “Há um problema sério de regulação e
fiscalização”, diz Veridiana Alimonti, do Idec. Segundo ela, há um plano geral
desde 2000, que propunha metas progressivas, mas há metas de 2003 que permanecem
iguais. O índice de chamadas completadas foi proposto em 2004. “Os planos
aprovados previram metas, mas a base de clientes aumentou”, diz ela.
Queixas. “A telefonia é o único setor em que o atendimento não evoluiu. Hoje
os bancos têm concorrência até para reduzir juros, mas a telefonia virou esse
caos”, diz Mauricio Vargas, fundador do site Reclame Aqui. O site recebeu 107
mil reclamações sobre operadoras de telefonia nos últimos 12 meses. As
principais queixas se referem ao sinal, à rede e à cobertura. Apenas a TIM e a
Vivo responderam às reclamações dos clientes no site.
O número de queixas é grande, mas especialistas dizem que pode ser ainda
maior. Hoje a Anatel baseia suas ações repressivas no número de reclamações no
Procon – o ideal seria contabilizar também as reclamações via call center. Hoje
o usuário pode reclamar direto nas empresas, no Procon ou outras ferramentas
para espalhar o problema e alertar outros usuários, como o próprio Reclame Aqui
e o site Zaanga. A Anatel recebe reclamações via telefone e internet – mas,
online, o mecanismo é pouco intuitivo.
Para a Economist, a crise das telecomunicações “guarda muitas
semelhanças com o apagão”: investimento baixo, negligência diante do aumento da
demanda e um pobre quadro legal e regulatório. “O apagão provocou retração na
economia brasileira”, recorda a revista. E ela projeta: a demanda deve aumentar
ainda mais por causa da Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016 – sem falar no leilão
do 4G, a internet móvel dez vezes mais rápida do que o 3G, vencido por Vivo,
Claro, TIM e Oi