05 março 2011

Especialistas discutem desafios para o transporte sobre trilhos

Governo apresenta medidas a médio e longo prazo para setor. Para sociedade civil sobra planejamento e falta soluções imediatas

Superlotação, ineficiência no atendimento das populações que vivem distantes do centro comercial de São Paulo, sobreposição de planos e falta de efetividade na expansão da rede metroferroviária são alguns dos problemas apontados por especialistas a respeito do sistema de transporte sobre trilhos da cidade de São Paulo.

As falhas acontecem diariamente tanto na Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô) quanto na Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e a população que depende do transporte público para se locomover tem que conviver com elas e ainda pagar uma tarifa alta para utilizar o sistema.

O governo apresenta soluções, como a expansão da rede metroferroviária, no entanto, as previsão para que as medidas sejam implementadas são somente a médio e longo prazo.

Na última terça-feira (01), representantes do Metrô e da CPTM, juntamente com especialistas em transporte e membros da sociedade civil participaram do seminário “Os desafios dos sistemas de transporte de passageiros de alta e média capacidade na cidade de São Paulo”, organizado pelo Grupo de Trabalho Mobilidade Urbana, da Rede Nossa São Paulo. Estiveram presentes representantes do governo e da sociedade civil.

No encontro foram levantados os problemas do transporte sobre trilhos e os desafios para que o sistema opere com efetividade.

Muito planejamento, pouca ação

Marcos Kassab, assessor da presidência do Metrô e irmão do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, participou do seminário como representante do secretário estadual dos Transportes Metropolitanos, Jurandir Fernando Ribeiro Fernandes. Kassab apresentou dados sobre o crescimento da população da Região Metropolitana da capital paulista e do uso da rede metroviária ao longo dos anos. Além disso, fez um relato sobre os desafios que estão colocados para solucionar os problemas da rede.

Para Manuel Xavier Lemos Filho, diretor da Federação Nacional dos Metroviários (FENAMETRO), mais do que informações e dados, é necessário que o governo estadual tenha um plano de ação efetivo. “O estado tem as informações para fazer um bom planejamento”, afirma.

Segundo o sindicalista, a falta de efetividade é decorrente das alternâncias de prioridade entre uma gestão e outra.

Neste sentido, Marcos Kiyoto, arquiteto e consultor da organização TC Urbes na área de transportes de alta capacidade, aponta como principais motivos da não conclusão dos planos de expansão da rede metroferroviária a sobreposição de planos, a descontinuidade dos projetos e a ausência de prioridades no planejamento.

A Secretaria de Transportes Metropolitanos (STM) em 1998 lançou o primeiro plano para o sistema de transportes, o Plano Integrado de Transporte Urbanos (PITU) que previa ações até 2020. Cerca de oito anos depois, lançou o segundo PITU, que valeria até 2025. Após um ano, em 2007, foi lançado o Plano de Expansão, que seria de 2007 a 2010. Em 2009, outro plano de expansão foi anunciado pelo governo estadual, o Expansão SP de 2009 a 2012.

“A gente percebe que os planos estão mudando mais rápido do que as linhas estão sendo construídas. Então, na verdade, a gente não tem uma gestão muito definida”, afirma Kiyoto, que toma como exemplo a linha 4-Amarela, que começou a ser construída em 2004 e tem previsão de término somente em 2014.

“A gente não tem uma rede, a gente tem uma malha que foi construída para transportar café do interior para Santos”, explica o arquiteto. Para Kiyoto, o sistema de transporte sobre trilhos de São Paulo está muito longe do ideal. Ele defende a necessidade de criação de intersecções para que a malha metroferroviária se transforme de fato em uma rede. Isto significa cruzar as linhas de modo a dar opções de transbordo para os usuários.


Expansão

Epaminondas Duarte Junior, representante do Metrô, falou sobre o plano de expansão da rede metroviária e os prazos para que as novas linhas comecem a operar. Segundo ele, as quatro estações faltantes da primeira fase de implementação da linha 4–Amarela – Luz, República, Butantã e Pinheiros – deverão ser entregues até o final deste ano. A segunda fase, que terá mais cinco estações, está em licitação e a previsão é de que fique pronta em 2014. A linha foi privatizada e é administrada pelo Consórvio Via Quatro.

Marcos Kiyoto, no entanto, lembra que a primeira fase da linha 4 deveria ficar pronta em 2008, conforme anunciado no início do projeto, e a segunda fase em 2009. Hoje a linha opera apenas com duas estações, Paulista e Faria Lima, inauguradas em maio de 2010. Elas funcionam das 8 às 15hs e o usuário tem que pagar a tarifa de R$ 2,9 para utilizá-las.

“O que se espera de uma linha de metrô é que ela funcione e não funcione aos pedaços. A implantação de uma linha pode ocorrer enquanto ela vai ficando pronta, mas é inconcebível que ela opere aos pedaços”, completa Manuel Xavier.

Ailton Brasiliense Pires, assessor da diretoria de planejamento da CPTM e presidente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), fez um resgate histórico do surgimento dos sistema sobre trilhos, que nasceu a partir da CPTM. Para ele, a solução para a mobilidade urbana na capital paulista e na região metropolitana de São Paulo está no investimento no transporte de alta capacidade. “Se nós tivéssemos aprendido a lição iríamos adensar em torno do transporte de grande capacidade, pelo qual a cidade foi construído”, defende Pires.


Mudança de modelo

“O que nós temos que fazer, engenheiros e arquitetos, é definitivamente nos propormos a discutir o futuro da cidade”, finaliza o presidente da ANTP.

Para Lucas Monteiro, militante do Movimento Passe Livre (MPL), “um plano de expansão da rede metroferroviária descolado de um plano de política de habitação social vai continuar reproduzindo os problemas que a gente tem de grandes deslocamentos”.

Além disso, conforme ele, na lógica atual do sistema de transporte o usuário está continuará sendo onerado pela tarifa, que sempre sofrerá reajustes, como no último dia 13 de fevereiro em que o calor subiu de R$ 2,65 para R$ 2,9.

“O problema é que o custo do transporte é inteiramente repassado para o usuário”, afirma Monteiro. Segundo ele, pensa-se o transporte a partir do custeamento por parte do usuário, o que é uma lógica equivocada. “É a lógica de não tratar o transporte, não tratar a mobilidade como um direito”, lamenta.

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