26 setembro 2013

Trânsito caótico e poluição matam 6 milhões por ano, segundo OMS

A vida nas grandes cidades lentamente transforma pessoas saudáveis em doentes crônicos. 

Um dos maiores vilões da saúde nas metrópoles mundiais é a poluição, gerada em grande parte pela frota de veículos exagerada e pelo transporte público deficiente. 

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), todos os anos, cerca de 6 milhões de pessoas no mundo perdem suas vidas por causa da poluição do ar. 
 
A entidade estuda os efeitos da falta de mobilidade urbana sobre a saúde há pelo menos 15 anos. 

Neste período, constatou que outras milhares de pessoas desenvolvem doenças crônicas degenerativas causadas pelo estilo de vida nas metrópoles: elas matam em longo prazo ou debilitam a saúde, deixando uma multidão de indivíduos produtivos incapazes de desenvolverem suas atividades. 

Até 2050, a poluição do ar será a principal causa das mortes prematuras por câncer de pulmão em nível global. 

Esta é a afirmação de uma equipe de especialistas da Universidade de São Paulo (USP) em recente artigo publicado pela revista Nature. Países em desenvolvimento são apontados como os mais vulneráveis a este mal. 

"Cidades da China, Índia, Indonésia e Brasil possuem níveis de poluição muito altos, mas há outras que não medem e não informam a poluição do ar, que pode ser maior. 

O fato de estarem se comparando é sinal de que querem melhorar", afirma Carlos Dora, coordenador do departamento de saúde pública e meio ambiente da OMS. 

"Vários estudos mostram que os corredores de trânsito são as chaminés das cidades modernas", afirma Paulo Saldiva, patologista e professor da USP. Segundo ele, entre 70% e 90% dos poluentes do ar são produzidos pelos veículos. 

"A poluição ambiental é de duas a três vezes maior na cidade. Você fica muito tempo imerso no pior cenário", analisa. 

O pesquisador é categórico ao confirmar a relação entre o tráfego urbano e o adoecimento da população. 

Segundo ele, apesar de nas grandes cidades a expectativa de vida ser maior do que em áreas rurais, onde há menor acesso a tratamentos de saúde, nos centros maiores o índice de doenças crônicas degenerativas e enfermidades psíquicas é muito superior. 

Em todo o mundo, 8% dos casos fatais de câncer de pulmão estão relacionados à poluição do ar. 

O efeito cumulativo da inalação contínua de nanopartículas e gases tóxicos como chumbo e cádmio podem causar outra série de problemas de saúde, que vão desde o aparecimento ou agravamento de doenças respiratórias, até problemas cardíacos, aumento da pressão arterial, diminuição da produção de lágrima, maior coagulação sanguínea, depressão, esquizofrenia e problemas reprodutivos. 

"A poluição do ar gera em pequena escala os mesmos efeitos que o cigarro causa de forma mais individual e rápida. 

Em São Paulo, 15% das pessoas fumam, mas a poluição do ar afeta 100% da população, por isso, o risco atribuído da poluição é significativa", indica Saldiva. 

Só na região metropolitana paulista, cerca de 4 mil pessoas morrem todos os anos por problemas atribuídos à poluição do ar. 

O tráfego urbano também geram outros problemas já comprovados por estudos científicos. 

Em muitos lugares, é difícil dormir por causa do barulho e, mesmo quando os moradores pegam no sono, ele é de má qualidade. 

Isso afeta o sistema nervoso, a produção hormonal, além de gerar dificuldade de concentração e perda de memória. 

ISOLAMENTO E DEPRESSÃO
 
Em cidades como São Paulo, as pessoas gastam quase um quarto do dia para se deslocar de casa para o trabalho.

Situação que gera isolamento social e compromete o desenvolvimento. 

"Por causa da má qualidade do transporte público, as pessoas buscam os carros. 

A população está cada vez mais confinada, seja em casa ou no modelo particular de locomoção", alerta Marília Flores Seixas de Oliveira, doutora em desenvolvimento sustentável e professora da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Uesb. 

Para a pesquisadora, a falta de convivência da comunidade no espaço urbano deixa a pessoa suscetível ao desenvolvimento de problemas como depressão e ansiedade, causados pela ausência de sociabilidade. 

"Hoje, a depressão pode levar à morte. 

As doenças não violentas estão matando muito", comenta Olveira. 

"Se você tem mais de 60 anos, uma das coisas que mais impactam na expectativa de vida é a falta de atividade social", reforça Saldiva. 

Contexto que também gera o sedentarismo. Cada vez mais as pessoas vivem em escritórios e dentro de veículos. 

A falta de locais para se exercitar e a insegurança acabam servindo como justificativas para não praticar exercícios físicos, o que acarreta em inúmeras doenças potencializadas pelo stress mental e a poluição. 

Carlos Dora garante que este cenário pode ser mudado se os gestores públicos pensarem as cidades relacionando a mobilidade urbana com a saúde pública. 

"Uma estratégia para aumentar a média de exercício na população é aumentar a mobilidade. Fazer com que ela seja integrada à rotina diária", garante. 

Conforme a OMS, o exercício físico reduz em 50% o risco de desenvolver câncer de cólon, doenças coronarianas, diabetes e obesidade. 

Quando as cidades oferecem um sistema de transporte público adequado e espaços para caminhadas de pequenas distâncias, as pessoas são incentivadas a se movimentarem mais. 

"Uma grande parte dos deslocamentos é feita em curtas distâncias e quando se faz isso com o automóvel o problema da poluição é agravado, pois o pico de emissões poluentes ocorre quando o veículo é ligado". 

Cidades europeias já conseguiram fazer isso, afirma Dora. Estes países primam pela aproximação do uso do solo, diferente do que ocorre em locais como Estados Unidos e Austrália, onde a dispersão do espaço urbano exige o uso de veículos automotores. 

"Nos últimos dez anos, vimos o início de um movimento que privilegia a bicicleta, o pedestre e o transporte público. Você faz das ruas algo prazeroso. 

Na década de 1990, era dificilíssimo falar na Europa em uso da bicicleta, mas isso mudou. 

Hoje, isso é sinônimo de cidade com boa qualidade de vida", conclui o representante da OMS. 

http://www1.folha.uol.com.br/dw/2013/09/1342608-transito-caotico-e-poluicao-matam-6-milhoes-por-ano-segundo-oms.shtml

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