O governo federal planeja lançar um conjunto de medidas destinadas a
facilitar as parcerias público-privadas (PPPs) para obras e serviços voltados à
mobilidade nas médias e grandes cidades.
As mesmas já estão sendo debatidas por
um grupo de estudos e vão entrar em vigor no máximo dentro de 1 ano — e
provavelmente antes disto. Brasília está convencida de que, sem uma forte
presença da iniciativa privada, não conseguirá resolver os problemas de
transporte de metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro, nem mesmo os de
municípios de porte moderado, como Campinas (SP), Joinville (SC), Londrina (PR)
e outros.
Em jogo estão: R$ 32 bilhões do PAC Mobilidade Grandes Cidades,
destinados à construção de 600 quilômetros de vias, 200 quilômetros de trilhos,
381 estações e terminais, e à aquisição de 1.060 veículos para sistemas sobre
trilhos; R$ 7 bilhões do PAC Mobilidade Médias Cidades, voltados ao transporte
público em municípios que tenham entre 250 mil e 700 mil habitantes; e também
parte dos R$ 12 bilhões que vão para as 12 cidades-sede da Copa de 2014.
“Vamos criar um modelo que incentive as empresas a investirem em mobilidade
nas cidades junto com o governo. Para tanto, as PPPs neste campo terão normas
específicas, desenhadas de modo a agilizar a execução de obras do tipo no meio
urbano e a facilitar a participação do setor privado em tais obras e também na
administração dos serviços de locomoção que delas surgirem”, afirmou ao
DCI Alexandre Cordeiro Macedo, secretário-executivo do Ministério das
Cidades.
Holanda, Dinamarca...
A iniciativa privada, por seu turno, está de olho nestas medidas que virão.
“Queremos investir em mobilidade urbana, o setor nos interessa. Mas a decisão de
atuar ou não no mesmo depende sempre de uma avaliação da modelagem legal de cada
negócio”, pontua Gustavo Nunes da Silva Rocha, presidente da Invepar, que opera
no mercado de infraestrutura de transportes.
Cordeiro Macedo observa que a ideia não é apenas estimular as empresas a
despejarem recursos e capacidade gerencial no transporte dentro das cidades, mas
também forçar uma mudança cultural no modo como as pessoas se locomovem no País
dentro do meio urbano: “Vejam os exemplos que temos no exterior”, diz ele. “A
Holanda conta com nada menos que 34.000 quilômetros de ciclovia.
Na Dinamarca a
bicicleta é o segundo meio de transporte mais importante. Em Cingapura o governo
está trabalhando para que, até 2020, ninguém tenha de andar mais de 600 metros
para chegar a um ponto de transporte coletivo. É neste sentido que queremos
avançar.”
Macedo falou ao DCI na sexta-feira, em São Paulo, durante um
evento no qual também estava Bernardo Figueiredo, presidente da estatal Empresa
de Planejamento e Logística (EPL). Ele completou as palavras do colega: “O
Brasil não pode abrir mão de zerar seu passivo na infraestrutura de transportes
no meio urbano, além de fazer o mesmo em se tratando do transporte de longas
distâncias pelo interior do País”.
BNDES: sim ou não?
Uma das questões que polarizaram o encontro, ocorrido em um auditório da
Fundação Getúlio Vargas (FGV), foi o financiamento às empresas para que possam
atuar em infraestrutura — setor que quase sempre exige pesados aportes de
capital. Em outros países, quando precisam de recursos, as companhias não têm
muitas alternativas senão emitir ações ou debêntures para tanto.
No Brasil,
porém, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) não raro
empresta dinheiro às empresas nestes momentos. Isto pode ser bom — mas também
pode ser ruim.
“Não podemos criar uma geração de empresários deseducados no Brasil, que
recorrem ao BNDES sempre que precisam de capital”, crava a respeito Paulo
Cesena, diretor-presidente da Odebrecht Transport.
A empresa tem, comentou
Cesena, um exemplo forte de atuação em mobilidade urbana na cidade de Lima,
capital do Peru: o consórcio liderado pela Odebrecht acaba de vencer a disputa
pela concessão do projeto Vias Nuevas de Lima, o qual terá investimentos
equivalentes a R$ 1 bilhão.
O contrato estipula a construção de um novo sistema
viário na capital peruana.
O objetivo da iniciativa é reduzir o tempo de viagens
e melhorar o transporte público de Lima, que hoje sofre com um trânsito caótico.
As obras deverão ficar prontas em 3 anos — e, detalhe: serão 100% financiadas
pela iniciativa privada.
Atividade sensível
Polêmicas à parte, os empresários brasileiros aguardam a promulgação das
normas que regerão as parcerias público-privadas da mobilidade urbana para
entrarem mais fortemente neste campo.
Embora já trabalhem, em casos isolados,
com PPPs dentro deste tipo de negócio, um arcabouço legal específico e mais
favorável à área será bem-vindo, concordam todos.
A CCR, por exemplo, opera a
Linha 4 do metrô paulistano e a barca Rio-Niterói. Ricardo Castanheira,
vice-presidente da empresa, fala sobre as características do transporte nas
cidades: “É uma atividade sensível do ponto de vista da imagem da companhia,
pois oferecemos nossos serviços diretamente aos cidadãos. Mas, estando bem
regulamentada, a área é atraente”.
Por sinal, sexta-feira surgiu uma notícia emblemática das dificuldades do
setor: o cancelamento da construção do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) de
Brasília, que seria feito em parceria com a França e estava paralisado havia
quase 2 anos devido a denúncias de corrupção.
A iniciativa fazia parte dos
planos de melhoria do transporte na capital do País visando ao mundial de
futebol, que terá Brasília como uma de suas 12 cidades-sede.
O projeto pretendia
unir o aeroporto a uma zona hoteleira que fica a 500 metros do estádio que está
sendo erguido para o evento.
A decisão de cancelar o VLT foi do governo regional
de Brasília, o qual descartou o empreendimento após constatar que, em razão dos
processos que tramitam na Justiça sobre supostas irregularidades, o equipamento
não ficaria pronto a tempo para o campeonato