13 outubro 2012

Porto Alegre entra na reta final de preparação para 2014


 Além das obras de infraestrutura, para aproveitar o verdadeiro potencial turístico da Copa do Mundo, é preciso qualificar serviços diretamente ligados ao atendimento do público. Mas, afinal de contas, ainda há tempo hábil para isso?

A preparação brasileira para a Copa do Mundo entra na reta final. Faltando 611 dias para a abertura do evento, setores diretamente envolvidos com o Mundial ainda correm atrás dos resultados. 

Para reverter o placar adverso e não decepcionar os 600 mil turistas projetados pela Embratur para o evento em todo o País, é preciso evitar que o duelo seja decidido na prorrogação. 

No Rio Grande do Sul não é diferente, e segmentos considerados de primeira importância para a recepção dos visitantes lutam contra o tempo e buscam a adesão em cursos de línguas e qualificação profissional.

Neste aspecto, a comunicação ganha posição de destaque na escalação de prioridades. Entretanto, essa parece ser uma das principais carências até o momento. 

Em um dos exemplos negativos, com base em levantamento do Sindicato dos Taxistas (Sintáxi), entre os 10,5 mil taxistas cadastrados junto à EPTC não mais do que uma dezena pode ser considerada fluente para o atendimento aos estrangeiros. 
No ponto da estação rodoviária, o supervisor Celso Rovani afirma que, dos mil carros disponíveis, somente dois profissionais estão aptos a receber clientes de língua inglesa.

Entre os cobradores e motoristas que operam os 1.650 ônibus distribuídos nos quatro consórcios, que atuam nas bacias geográficas das zonas Sul, Leste, Sudeste, Norte, do Centro da cidade e nos 403 veículos linhas de lotação, não há sequer estimativas sobre o nível de capacitação em idiomas e, tampouco, tempo suficiente para incrementar a habilidade até 2014. 

A expressão “Imagina na Copa!” virou um jargão nacional e tem demonstrado a preocupação dos brasileiros quanto à falta de preparo para o maior evento futebolístico do mundo.

 A julgar pelas incertezas e o pouco tempo que permeiam os preparativos, a postura defensiva pode ser justificada.

O diretor da Achieve Languages Oxford, João Tomazeli confirma a tese. Segundo ele, para ter um vocabulário interessante, é preciso de 500 a 550 horas de estudo. 

Num curso regular, de até três horas por semana, que representam 80 a 100 horas por ano, seriam necessários, no mínimo, cinco anos de aprendizado. “Uma criança faz isso, entra na classe de línguas quando ingressa na escola.

Assim, quando chegar à faculdade, será fluente em um ou mais idiomas. Muitas vezes, os adultos não têm vontade, disciplina ou tempo de fazer o mesmo”, avalia.

Aspectos referentes à mobilidade urbana também dependem de resoluções, entre eles a falta de informação sobre linhas e trajetos em pontos de ônibus. Uma ação permanente da EPTC tem o objetivo de desenvolver um modelo padrão para os espaços, mas ainda não contempla displays ou informações bilíngues. 

Das 5.453 paradas existentes, 3.587 possuem algum tipo de proteção, ou aproximadamente 65,78%. Destas, 2.417 devem atingir o padrão desenvolvido, segundo levantamento da própria instituição.

Como o sucesso em 2014 não depende somente das obras, mas também dos serviços ofertados, um grupo formado por cerca de 20 guias turísticos da Região Metropolitana decidiu conhecer melhor Porto Alegre. 

Depois de três módulos oferecidos por um dos programas municipais, chegou o momento de colocar a mão na massa com um passeio na Linha Turismo.

Na visão dos participantes, no entanto, ainda há muito por ser feito antes de responder a uma pergunta vital às suas pretensões profissionais: que Porto Alegre os 60 mil visitantes esperados encontrarão daqui a dois anos?

Apesar de elogiar iniciativas como as do workshop, a guia de turismo Lucidia Cauduro identifica mais carências do que avanços na Capital. 

Entre os pontos negativos em destaque, ela cita a falta de acesso para as excursões que utilizam micro-ônibus no Centro Histórico e as dificuldades de chegar ao novo sítio do Laçador. “Percebo potencial turístico, mas muitas deficiências para desenvolvê-lo”, acrescenta. Já a turismóloga Michelle Carvalho se revela bastante otimista. “Estou em busca de qualificação, pois a Copa deve ser um grande momento.

 Pessoalmente, tomei coragem de deixar o meu antigo emprego para me preparar melhor para receber o evento”, afirma, ao lembrar que ainda há muito por ser feito e pouco tempo para reverter o quadro atual.

África do Sul traz expertise ao Rio Grande do Sul


Cumprindo agenda no Rio Grande do Sul, a responsável pela organização da Copa na Cidade do Cabo (África do Sul) há dois anos, a sul-africana Neliswa Nkani, esteve em Caxias do Sul na semana passada para a realização de palestras em uma das candidatas a subsede no Estado. 

Diretora da Cape Winelands District Municipality para garantir que as regiões vinícolas próximas à capital daquele país fossem divulgadas, ela reforça que a preparação e o inglês, língua oficial da sede de 2010, foram grandes facilitadores das metas traçadas. “Na África do Sul, a língua foi um aspecto que facilitou a comunicação, mas também tivemos de lidar com turistas franceses, alemães e japoneses e tivemos que nos adaptar. Entretanto, o inglês é a nossa língua mais universal”, analisa.

Na ocasião, entre estrangeiros e nativos, afirma Neliswa, mais de 1,5 milhão de pessoas passaram pela sede, que recebeu 13 jogos e mais de 10 seleções, ao longo de 30 dias. Boa parte, explica ela, optou por visitar rotas turísticas alternativas, que exigiam deslocamento entre cidades e comunicação adequada para descobrir os novos destinos. “Tivemos um aumento significativo no turismo de alguns países do bloco europeu. 

A percepção do mundo a respeito da África do Sul foi alterada radicalmente. Isso segue mudando a cada dia”, complementa.

Para Neliswa, os reflexos não são restritos ao período do pós-Copa. Em 2010, a média de gastos dos turistas europeus chegou a quase € 200,00 por dia, sem contabilizar a hospedagem.

O câmbio favorável - em que € 1,00 equivalia a 9 rands sul-africanos - ajudou a compor um custo-país que tornou a África extremamente atrativa e trouxe um incremento importante para o desempenho econômico já naquele ano. “É preciso agir agora. As decisões precisam ser tomadas. Vocês têm de escolher as prioridades e acordar para o fato de que o mundo está de partida para o Brasil e a chegada tem hora marcada para acontecer”, adverte.

Medidas paliativas podem ajudar a suprir carência em idiomas


Lenhart aposta em soluções paliativas, como os cardápios multilíngues. MARCO QUINTANA/JC
Durante um evento realizado em Buenos Aires em setembro para promover o turismo em mercados prioritários, o diretor-chefe da divisão de Hospitalidade, Negócios e Serviços da Fifa, Jean-Edourd Courcier, reforçou a tática necessária para virar o placar da preparação. 

Nas palavras do executivo, os fãs de futebol, além dos ingressos, esperam por comodidade em hotéis, facilidades de locomoção, boa alimentação e bebida, diversão, festas e conhecer novas pessoas.

Uma das principais barreiras a serem vencidas, neste cenário, é a falta do domínio da língua inglesa e de outros idiomas. Na visão do secretário municipal do Turismo, Raul Mendes da Rocha, uma das críticas mais recorrentes, muitas vezes, não depende apenas da vontade política. “As pessoas se esquecem de que, para apreender um novo idioma, é preciso interesse por parte do aprendiz. Existem alguns cursos disponíveis, e faltam inscritos”, afirma.

Por isso, a aposta para amenizar o problema é a primeira tiragem, de 100 mil exemplares, dos chamados guias práticos. O material, complementado pela instalação de 130 placas informativas no Centro Histórico, será distribuído em pontos estratégicos. O conteúdo contempla diálogos comuns em cinco situações corriqueiras: restaurantes, hotelaria, compras, aeroporto e transportes.  “Os panfletos editados em espanhol e inglês podem ser uma oportunidade de praticar conversações simples, em uma espécie de quebra do estranhamento com o primeiro contato com a língua”, afirma.

Sobre o tema, o presidente do conselho do Porto Alegre Convention & Visitors Bureau e proprietário de restaurantes, Norton Lenhart, concorda com a ação e declara não haver mais tempo para o aprendizado de idiomas. “Honestamente, quando vejo as pessoas falarem em cursos para a Copa, penso que ninguém aprende a falar inglês assim. Por isso, temos que trabalhar em soluções paliativas como os cardápios multilíngues”, defende.

Lenhart já aplica a medida em seu estabelecimento há pelo menos cinco anos, com menus em português, inglês, espanhol, alemão e em braille. Apesar de atestar a existência de empresas de tradução e gráficas qualificadas para atender a esta demanda na Capital, afirma que a prática não é muito difundida entre os proprietários. “É uma pena, mas ainda há tempo para fazer esta adaptação”, revela. Segundo ele, o recurso pode resolver 90% dos problemas de comunicação nos bares e restaurantes durante o Mundial.

Representante de comissões da Organização Mundial do Turismo (OMT) e com experiências adquiridas nas duas últimas Copas, na África do Sul e na Alemanha, Lenhart alerta para um fator que costuma ser esquecido pelos agentes de turismo. “Os grandes eventos paralisam o turismo que ocorre normalmente. Um dos grandes pilares é a realização de congressos, eventos e feiras e, nesta época, tudo será direcionado à Copa”, avalia.

Para combater a situação, ele defende maior empenho na organização dos atrativos turísticos do Estado. “No setor de hospedagem e alimentação, estamos preparadíssimos para a Copa, mas o nosso diferencial competitivo sairá de uma grande dificuldade. 

Enquanto o Nordeste terá o clima quente tropical, nós estaremos em pleno inverno. As pessoas procuram o tropical, e será o momento de alterar esta percepção. A região da uva e do vinho será importante, pois é um produto turístico da mais alta qualidade em qualquer parte do mundo.”

Taxista bilíngue larga em vantagem na disputa por melhores clientes em 2014


Enquanto aguarda no ponto da rua Coronel Bordini esquina com a 24 de outubro, Marcelo Marques mantém uma rotina que pode fazer toda a diferença na Copa de 2014. 

Entre os 10,5 mil taxistas cadastrados de Porto Alegre, é considerado uma raridade, pois domina o idioma inglês e, sempre que pode, entre uma corrida e outra, abre o porta-luvas em busca de literatura estrangeira como forma de incrementar o vocabulário aprendido durante os seis anos em que residiu em Londres.

No retorno da capital inglesa, há três anos, assumiu a placa, antes ocupada pelo pai. De lá para cá, o diferencial já rendeu bons frutos e, no mínimo, uma vez por semana é chamado para corridas que envolvem o transporte de turistas, a maioria executivos. 

A prática é fruto de um intenso trabalho de divulgação junto à rede hoteleira, ao Tecnopuc e a outros locais em que ele constatou o intercâmbio intenso das empresas com executivos de outros países.

Algumas tentativas para amenizar a falta de profissionais bilíngues já foram implementadas e geraram polêmicas entre a EPTC e o Sindicato dos Taxistas. De um lado, a categoria alega não ter sido informada sobre as aulas. De outro, o órgão público afirma não ter obtido o quórum necessário para os estudos.

Alheio às discussões, Marques diz ter procurado a EPTC para colaborar, entretanto, não obteve retorno favorável. “É uma pena, pois muitos colegas acreditam que os turistas chegarão com um endereço anotado em um pedaço de papel e está tudo certo. Infelizmente, esquecem-se de que, durante os 15 dias de Copa do Mundo, teremos uma oportunidade intensa para lucrar. 

Quem sabe com viagens até a Serra, ou com roteiros internos de turismo”, analisa o motorista, que concluiu, no mês passado, um dos módulos do Projeto Dicas Turísticas, da secretaria municipal. 

O próximo passo, segundo Marques, será um curso de espanhol e talvez um terceiro idioma, para ampliar a nicho de atuação.

Iniciativas públicas e privadas buscam melhorar atendimento


Praia de Belas Shopping investiu em cursos de inglês. MARCO QUINTANA/JC
Algumas ações públicas e em parceria com a iniciativa privada saíram do papel, estão prontas para entrar em campo e facilitar a recepção aos 60 mil visitantes esperados pela Capital, por onde passarão, entre os dias 15 e 30 de junho, no mínimo, nove seleções e, no máximo, dez, dependendo do cruzamento das chaves nas oitavas de final. 

De olho nas melhorias de atendimento ao público, o Praia de Belas Shopping investiu em cursos de inglês para os colaboradores. A atividade, com duração de seis meses, é uma parceria do shopping com a Minds English School, de Porto Alegre, e envolve ao todo 30 funcionários de setores como segurança, marketing e estacionamento.

Uma das alunas do curso, a recepcionista Lourdes Noal comemora os efeitos das primeiras cinco aulas. As situações embaraçosas, vividas anteriormente no balcão de atendimento, foram transformadas em oportunidades de aprendizado. “O fluxo de turistas estrangeiros no shopping é diário, e antes a comunicação tinha de ser por gestos, agora já consigo indicar alguns locais, como a praça de alimentação e farmácias, que costumam ser bastante procurados”, revela.

Com conteúdos direcionados para o atendimento direto aos clientes, o inspetor de segurança Carlos Evandro de Nóbrega adquiriu maior confiança nos diálogos. 

Campeão nacional de basquete, em 1994, atuando pela extinta Pitt Corinthians, de Santa Cruz, ele também herdou da conquista o primeiro contato com a língua inglesa, em razão da convivência com os norte-americanos Brent Merrittv e Alvin Frederick.  “Já tinha uma boa compreensão e muitas vezes sou chamado pelos colegas para atender aos turistas, mas agora tenho a chance de elaborar melhor a pronúncia e, até a Copa, pretendo incrementar bastante o vocabulário”, projeta o funcionário que deixou as quadras e atua nos corredores do shopping há dois anos.

Com uma turma formada por 40 integrantes do 9º Batalhão da Polícia Militar, que fazem policiamento do Centro Histórico, o programa Porto Alegre Turística, da Secretaria Municipal do Turismo, estreou o novo formato, que passa a oferecer quase 11 horas de qualificação gratuita sobre atendimento, hospitalidade e prestação de informações a respeito da cidade. 

O projeto também pode ser acessado por profissionais ligados direta ou indiretamente a atividades do turismo, como frentistas, taxistas, integrantes da Guarda Municipal e da Brigada Militar, proprietários de bancas de revista, trabalhadores do comércio varejista, empreendedores rurais, servidores municipais, agentes de viagem e guias de turismo. Realizado há um ano como um workshop de duas horas de duração, o programa superou os 1,5 mil participantes até o mês de julho. 

Na nova versão, Porto Alegre Turística passa a ser oferecido mensalmente, até dezembro, com 40 vagas por mês.

Em esfera estadual, a Secretaria do Esporte e do Lazer abriu vagas em curso de idiomas (90 horas para inglês e espanhol) e segurança e turismo (60 horas). 

Ao todo, serão 1,5 mil vagas disponíveis aos servidores públicos na modalidade educação a distância, com inscrições até dia 15 de outubro.

No Sebrae, capacitações on-line com a criação de portais como o Taxista Empreendedor - voltado a ampliar o nível de gerência, por meio da distribuição de 155 mil kits no País e disponibilização de aulas multimídia na internet - e o Sebrae 2014, pensado para orientar os donos de micro e pequenas empresas que procuram empreender por conta do Mundial. 

O programa está disponível nas 12 cidades-sede e reúne informações úteis, inclusive com calendários de licitações.

O presidente do Sindicato da Hotelaria e Gastronomia de Porto Alegre (Sindipoa), José de Jesus Santos, destaca a realização de cursos promovidos pela entidade, alguns em parceria com o município, com foco em camareiras e garçons. 

Em treze edições, 185 profissionais já passaram pela qualificação e mais 16 edições, com duração de três dias, estão previstas para novembro de 2012. 

Segundo Santos, a ideia é ampliar a atuação com formatos in company de atividades regulares oferecidas pela entidade desde 2002. 

Arquivo INFOTRANSP