15 julho 2011

Casa inteligente gera energia para eletrodomésticos e até para o carro

Casa inteligente gera energia para eletrodomésticos e até para o carro

Na coluna de ciência e tecnologia ‘Você não sabia, mas já existe’, Márcio Gomes mostra a casa em que nada se desperdiça.


É o sonho de muitos brasileiros: uma casa nova, toda planejada e econômica, sem desperdício. Será que é possível? O repórter Márcio Gomes foi pesquisar as últimas novidades na coluna “Você não sabia, mas já existe”.

A Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) é uma instituição importante. Tem mais de 100 anos de vida. A série “Você não sabia, mas já existe” foi conhecer o tal do escritório verde, a casa sustentável. Só de olhar a fase final de construção, percebe-se que ela não é comum.

Não se vê aquela quantidade de entulho, típica de obra. Há muita madeira, mas os forros são diferentes. O relógio de luz fica no meio da sala. O projeto é de um professor que leva o sonho no sobrenome: Eloy Casagrande. De concreto, no sentido literal da palavra, só mesmo as fundações.

O material parece madeira, mas ao ser tocado nota-se que a madeira é mole. Não é madeira. É PVC. Isso já existe lá fora há bastante tempo. “Isso existe: é um sistema construtivo que usa ‘wood frame’, o sistema de construção a seco que usa painéis de madeira em revestimentos internos e externos”, explica o professor Eloy Casagrande.

Ao entrar na casa, as surpresas continuam. A madeira usada para construir as janelas nasceu em um laboratório. É uma espécie de eucalipto geneticamente modificado e mais resistente. As paredes vêm de reflorestamento, com madeira certificada. São duplas para receber uma forração especial: um aspecto de algodão que o professor usou garrafas PET.

“Exatamente. São garrafas comuns. Para cada metro quadrado, eu usei 30 garrafas para reciclar. É um produto já usado no mercado. São sete mil garrafas que nós tiramos do ambiente para colocar na casa. Ela dá uma sensação agradável para quem está na casa tanto no inverno quanto no verão”, afirma o professor Eloy Casagrande.

A placa de borracha é feita de pneu velho. “Pneu reciclado que é retirado do meio ambiente. Para cada metro quadrado de uma a manta de cinco milímetros, eu tenho até três pneus reciclados. Em uma contabilidade que, por cima na casa, deixamos de jogar no meio ambiente 540 pneus”, calcula o professor.

Para chegar ao segundo andar da casa, a escada é ecologicamente correta e sustentável. Ela é feita com um material que parece aquele brinquedo de montar. “Isso é resíduo de escada de madeira de uma fábrica de escadas, que forma painéis com os toquinhos que sobram e acabam formando a escada. Esses toquinhos iam para o lixo. Vira quase uma peça de arte, uma estrutura”, explica o professor Casagrande.

Um dos pontos mais interessantes da casa fica no terraço no segundo andar. Em vez de usar um piso tradicional, eles preferiram grama. Forraram com grama a parte superior da casa. “É um isolamento térmico-acústico. Além de beneficiar a estética da cidade – se todos os prédios tivessem um telhado verde, seria uma maravilha – absorve água e carbono, e eu reduzo a temperatura interna de 3°C a 5°C”, diz o professor.

Um engenheiro, ao ver a grama no teto, ficaria apavorado – “Meu Deus do céu, como ele impermeabilizou isso aqui? Vai chover, essa terra vai absorver, vai dar infiltração”. Eloy Casagrande explica.

“O sistema está resolvido com tecnologias bastante avançadas. Eu tenho uma impermeabilização com borracha líquida. Coloquei uma manta de plástico para fazer reforço. Colo por baixo. Ainda tem o sistema de rufos, com proteção de metal, e eu tenho um sistema por baixo da grama. Esse é o sistema do ecotelhado. Na verdade, é o reaproveitamento de solas de sapato das fábricas do Rio Grande do Sul, de onde já vem a terra com substrato com os nutrientes. Eu modulo, coloco as neivas de grama e a grama se fixa. Há projetos para se fazer cidades suspensas na China com que toda a plantação da China seja feita em situações como essa: nos telhados verdes, no ecotelhado”, afirma o professor.

A água da chuva será coletada para regar as plantas e ser usada nos sanitários. No telhado, serão instaladas placas solares e uma turbina de energia eólica. Sol e vento vão gerar energia, e isso vai aparecer em um dos relógios instalados dentro da casa.

Não é bonito, mas é uma sala de aula. Outro relógio mostra o quanto a casa consome e um terceiro, quanto vai sobrar de energia. A produção eólica e a produção solar vão ser capazes de abastecer toda a casa e ainda sobrar energia?

“Depende de quanto tenho de sol e de vento. Ainda dependo do clima. Mas digamos que eu esteja de férias em janeiro, por 30 dias, e a captação solar seja intensa nesse período de verão. Eu posso dar essa energia passando direto para a rede. Eu me torno um gerador de energia na rede”, explica o professor.

A sobra poderá ser vendida à companhia de energia elétrica em um sistema inteligente de geração e consumo. Da construção da casa sustentável que gera sua própria energia, a Universidade Tecnológica Federal do Paraná tem também o projeto de um carro elétrico. Os dois projetos se somaram, já que a casa é capaz de alimentar o carro.

“Pelo menos, este é o projeto e estamos conseguindo fazer. O carro elétrico, quando ele for carregado na tomada normal da sua residência, pagando a conta de energia, já fica cinco vezes mais barato do que um carro convencional a etanol ou à gasolina. É o equivalente fazer 75 quilômetros por litro com seu veículo. Mas se abastecermos no escritório verde, por meio da geração de energia solar e eólica, gerando essa energia elétrica para carregar a bateria, aí fica de graça para você andar com seu veículo”, afirma Eloy Casagrande.

O carro ainda é um protótipo e está em fase de teste. A casa é um laboratório. Mas que ninguém duvide: projetos como esses já estão voando baixo no mundo inteiro

Arquivo INFOTRANSP